Desafinado – Newton Mendonça e Tom Jobim

Um dos maiores clássicos da Bossa Nova, e consequentemente da MPB, a canção Desafinado tem uma história bastante peculiar.

Desafinado de Newton Mendonça e Tom Jobim

Homenagem aos Desafinados

Em primeiro lugar, uma das peculiaridades foi o que motivou a dupla a iniciar a composição. Parceiros musicais da noite carioca, embalados por cerveja e conhaque, eles estavam tirando sarro dos cantores desafinados que tinham de acompanhar na época. A ideia, então, era compor uma música em “homenagem” a eles. E ainda que duvidassem que algum cantor sério aceitaria gravá-la, sua estrutura seria muito complicada para ser interpretada por cantores desafinados.

Ruy Castro conta no livro “Chega de Saudade” o tom jocoso que imperava no momento da criação. O verso “Fotografei você na minha Rolleiflex / Revelou-se a sua enorme ingratidão” levava Tom Jobim às gargalhadas. Newton e Tom iam se revezando nas funções, quando um assumia as teclas do piano, o outro  ficava a cargo de lápis e papel, e vice-versa.

E diferentemente do que muitos acreditam, quando eles dizem “Isso é Bossa Nova, isso é muito natural”, o termo Bossa Nova ainda não havia se consolidado. Eles estavam fazendo graça com uma gíria que era utilizada pelos jovens.

Fotografei você na minha Rolleiflex
Fotografei você na minha Rolleiflex

Desafinado à procura de um cantor

Quando finalmente a música ficou pronta, perceberam que havia potencial nela. Era uma espécie de samba piada, mas mesmo assim também não seria o caso de apresentar a algum intérprete renomado.

Tom e Newton mostraram Desafinado a Ivon Cury e depois a César de Alencar, ambos faziam certo sucesso, mas recusaram a oferta. Num outro encontro casual, foi a vez de Lúcio Alves, Luís Cláudio e João Gilberto a ouvirem. Os três aceitaram gravá-la. No entanto, João percebendo a preciosidade, se antecipou, disse que a música era dele e fim de papo.

João Gilberto passaria dias, aflito e preocupado, achando que Tom atrasava a conclusão dos arranjos de propósito e que, a qualquer momento, algum dos demais cantores poderia lançar a música primeiro. Afinal de contas, durante as gravações de seu primeiro single, com Chega de Saudade e Bim Bom (lançado em Agosto de 58, pela Odeon), João tivera alguns desentendimentos com Tom Jobim, que era o produtor da gravadora.

João sabia que Desafinado não fora feita especialmente para ele, mas era como se fosse, pois lhe caia como uma luva. Ele estava recebendo muitas críticas por quem não aceitava essa conversa de um modo inovador de cantar, que além de baixinho ainda tinha certo descompasso com o violão. Muitos especialistas achavam mesmo que ele cantava mal por natureza. Desafinado era uma resposta à altura.

Consagração!

Finalmente em novembro de 1958, João entra no estúdio pra gravar Desafinado e Hô-bá-lá-lá, que também sairiam num single de 78 rpm. Novamente o clima esquentou entre ele e Tom. João Gilberto chegou a chamar Tom Jobim de burro, na frente de todos. Era preciso respirar fundo e seguir em frente porque aquele baiano prometia.

Em fevereiro de 1959 o disco foi lançado. Chega de Saudade já estava estourando e Desafinado vinha pra ratificar a revolução musical em andamento. O próprio Tom, desavenças musicais à parte, insistiu com a gravadora para fazerem um LP de João Gilberto, e em março do mesmo seria lançado o álbum Chega de Saudade com 12 músicas. Desafinado abria o lado B.

A partir dali muitos outros artistas regravariam Desafinado. Os Cariocas, Roberto Menescal, Nara Leão, Gal Gosta, Leila Pinheiro, Ney Matogrosso e muitos outros. Além, é claro, do próprio João Gilberto, inclusive no disco em parceria com o astro do Jazz, Stan Getz lançado em 1964.

 

 

 

João Gilberto e Stan Getz


Letra de Desafinado

Se você disser que eu desafino, amor
Saiba que isto em mim provoca imensa dor
Só privilegiados têm ouvido igual ao seu
Eu possuo apenas o que Deus me deu

Se você insiste em classificar
Meu comportamento de antimusical
Eu mesmo mentindo devo argumentar
Que isto é Bossa Nova, que isto é muito natural
O que você não sabe, nem sequer pressente
É que os desafinados também têm um coração

Fotografei você na minha Rolleiflex
Revelou-se a sua enorme ingratidão
Só não poderá falar assim do meu amor
Ele é o maior que você pode encontrar

Você com a sua música esqueceu o principal
Que no peito dos desafinados
No fundo do peito bate calado
Que no peito dos desafinados
Também bate um coração.


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A História da Música Desafinado


E para conhecer toda a história da nossa música em mais detalhes, é preciso recorrer a livros.

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