Na década de 1940 vai acontecer uma importante transição em nossa música popular. Cabe frisar que, para este artigo, vamos considerar os anos de 1940 a 1949 para determinar tal década. Enfim, especialistas situam o ano de 1945 como o último da Época de Ouro, fase iniciada em 1929.
Ou seja, por metade da década de 40 houve a permanência de gêneros, estilos e artistas bastante influentes desde a década anterior. O samba e as marchas ainda faziam enorme sucesso. Mas o período é marcado também pela consolidação do samba-canção como líder nas paradas. E isso se deveu graças ao crescimento da influência do bolero cubano e do tango argentino em nossa música, além é claro, do jazz norte-americano.
Vale lembrar que, ainda nos anos 40, quem dita as modas é o Rio de Janeiro, capital do país e principal centro urbano. Mesmo duas expressões regionais, o Baião de Luiz Gonzaga e as canções praieiras de Dorival Caymmi, que despotaram durante a década, só obtiveram êxito graças à adesão do mercado musical carioca.
Politicamente, a ditadura do Estado Novo, vigente desde 1937 e que duraria até 1945, passa a influir nos rumos da música brasileira de diversas formas. Uma delas é através da criação do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), que mantinha os artistas sob controle, de uma forma ou de outra. Em decorrência cresce o número de músicas censuradas. Somente no ano de 1940, foram 373 vetos.
Além disso, o governo brasileiro elevou o samba à categoria máxima de nossa expressão musical, a fim de forjar uma identidade nacional. Mas para isso, era preciso sanear tal gênero, originalmente vinculado às camadas mais baixas da população, ou seja, os negros do morro. Dessa forma, os compositores eram incentivados a elevar o nível harmônico e temático do samba. Exaltar a malandragem, por exemplo, estava fora de cogitação.
E graças ao clima ufanista criado pelo governo, Ary Barroso compôs Aquarela do Brasil em 1939, ainda que ele não fosse getulista. Mas, por todas essas razões é que, no início dos anos 40, houve uma enxurrada de composições no estilo samba-exaltação.
O rádio estava definitivamente na vida dos brasileiros. E a Rádio Nacional, situada no Rio de Janeiro, era a grande líder de audiência. Outra medida do governo foi estatizar a emissora, para poder intervir em sua programação. Por outro lado, ao se tornar uma empresa pública que não visava o lucro, os valores arrecadados em publicidade podiam ser inteiramente destinados a manter um elenco de artistas de primeira linha.
O vozeirão dos cantores se mantinha em alta. Dentre os já consagrados, Francisco Alves era absoluto. O Rei da Voz completava, assim, duas décadas de supremacia.
Mas, Orlando Silva – principalmente – Silvio Caldas e Carlos Galhardo ainda disputavam as atenções com ele. Além, é claro, de Gilberto Alves.
Para completar, surgiam alguns fenômenos como Nelson Gonçalves (1941) e Dick Farney (1946) inovando com seu estilo jazzístico e seu canto manso (numa tradição iniciada com Mário Reis). Outro grande nome era Cyro Monteiro, que carregava a bandeira do samba tradicional.
Dentre as mulheres, os concursos de Rainha do Rádio agitavam a audiência. Linda Batista manteve o título de 1937 a 47. Sua irmã, Dircinha Batista, finalmente interrompeu a hegemonia em 1948.
Em relação a outras veteranas, Aracy de Almeida se mantinha firme nos holofotes. E Carmen Miranda, focando sua carreira em Hollywood, abria espaço para novas estrelas.
Uma delas, Marlene, fechou a década como a Rainha do Rádio, em 1949 e 50. Isaura Garcia, Emilinha Borba e Carmen Costa também chegaram à fama ao longo da década.
Outros nomes que se destacaram pela originalidade foram Dorival Caymmi e Luiz Gonzaga.
Caymmi já vinha desde 1939 firmando seu nome com sambas baianos e, nesta década, inovou com grandes canções praieiras. Além de ter começado a compor sambas-canções com igual sucesso.
E Luiz Gonzaga se tornou uma verdadeira sensação quando assumiu suas raízes nordestinas e passou a tocar Baião a seu modo. Asa Branca, de 1947, alçou seu nome como uma das maiores estrelas da nossa música.
Dentre os grupos, os Anjos do Inferno foram outra boa atração, sempre gravando músicas de grandes compositores. Os 4 Ases e 1 Coringa também conheceram o sucesso, e além disso colaboraram para introduzir o Baião nas paradas. Outro destaque vai para o Trio de Ouro, liderado pelo compositor Herivelto Martins e que teve várias fases, mas serviu, principalmente, para alçar a cantora Dalva de Oliveira ao estrelato.
Finalmente, e não menos importantes, destacamos outros compositores. Ary Barroso e Braguinha, mantiveram o prestígio obtido nos anos 30. Mas também foram tempos consagradores para Ataulfo Alves, Assis Valente, Wilson Batista, Geraldo Pereira, Humberto Teixeira, David Nasser, Wilson Batista, Lupicínio Rodrigues, Alcyr Pires Vermelho e tantos outros.. Sem falar nos grandes músicos, dentre eles, o arranjador Radamés Gnattali e Waldir Azevedo com seu irresistível choro “Brasileirinho”.
A qualidade do som tinha melhorado bastante devido ao desenvolvimento tecnológico dos aparelhos de captação e reprodução do som. Ou seja, em tese, estava mais agradável ouvir música!
E então, vamos aproveitar e falar das 15 músicas que selecionamos como as melhores dos anos 1940. Para termos uma ideia do que se ouvia na época, na nossa seleção foram escolhidos 7 sambas (Acertei no Milhar, É com esse que eu vou, Falsa Baiana, Canta Brasil, O samba da minha terra, Brasil Pandeiro e Você já foi à Bahia?), 5 sambas-canções (Copacabana, Esses Moços, Marina, Mensagem e Nervos de Aço), 1 canção-praieira (O Mar), 1 Baião (Baião) e 1 Toada (Asa Branca).
Mas, dentre os sucessos da época, havia mais Marchas e Marchinhas de Carnaval presentes na lista. Confira abaixo uma estimativa aproximada com as 10 músicas mais tocadas na década de 1940.
10 – Chiquita Bacana – Emilinha Borba (marcha-carnavalesca)
9 – Saudade Mata a Gente – Dick Farney (canção)
8 – Cocapabana – Dick Farney (samba-canção)
7 – Dama das Camélias – Francisco Alves (marcha)
6 – Maria Bethânia – Nelson Gonçalves (canção romântica)
5 – Canta Brasil – Francisco Alves (samba-exaltação)
4 – Ai que saudades da Amélia – Ataulfo Alves (samba/carnavalesco)
3 – A Dama de Vermelho – Francisco Alves (canção/valsa)
2 – Atire a primeira pedra – Orlando Silva (samba)
1 – Brasil – Francisco Alves e Dalva de Oliveira (samba-exaltação)
Um dos grandes sucessos na voz do cantor Moreira da Silva.
Etelvina / Acertei no milhar / Ganhei 500 contos / Não vou mais trabalhar
Você dê toda a roupa velha aos pobres / E a mobília podemos quebrar…
Asa Branca fez Luiz Gonzaga se tornar um grande nome da nossa música definitivamente.
Quando olhei a terra ardendo / Qual fogueira de São João
Eu perguntei a Deus do céu, ai / Por que tamanha judiação…
Primeira parceria entre Gonzagão e Humberto Teixeira. Sucesso do ano de 46 com o grupo 4 Ases e 1 Coringa.
Eu vou mostrar pra vocês / Como se dança o baião
E quem quiser aprender / É favor prestar atenção…
Um dos maiores sucessos do compositor Assis Valente, recusado por Carmen Miranda, mas foi lançado pelo grupo Anjos do Inferno.
O tio Sam está querendo conhecer a nossa batucada
Andam dizendo que o molho da baiana melhorou seu prato…
Lançada na voz de Chico Alves, Canta Brasil foi uma das maiores músicas de exaltação depois de Aquarela do Brasil.
Brasil / Minha voz enternecida / Já dourou os teus brazões
Na expressão mais comovida / Das mais ardentes canções…
Este samba-canção foi o primeiro grande sucesso do jovem cantor Dick Farney.
Copacabana, princesinha do mar / Pelas manhãs tu és a vida a cantar
E a tardinha o Sol poente / Deixa sempre uma saudade na gente…
Música fez grande sucesso em 1948 na voz do grupo Quatro Ases e Um Coringa.
É com esse que eu vou / Sambar até cair no chão
Com esse eu vou / Desabafar na multidão…
Sucesso na voz de Francisco Alves. Lupicínio Rodrigues se inspirou num jovem amigo que anunciou que iria se casar.
Esses moços / Pobres moços / Ah! Se soubessem o que eu sei
Não amavam / Não passavam / Aquilo que eu já passei…
O samba foi um dos maiores sucessos em seu ano de lançamento na voz de Cyro Monteiro, consagrando o nome de seu compositor, Geraldo Pereira.
Baiana que entra no samba e só fica parada
Não samba, não dança, não bole nem nada
Não sabe deixar a mocidade louca…
A música foi um grande sucesso em seu ano de lançamento através do conjunto Bando da Lua.
O samba da minha terra deixa a gente mole
Quando se canta, todo mundo bole…
Marina foi gravada por quatro intérpretes em seu ano de lançamento. Dick Farney, Nelson Gonçalves, Francisco Alves e Dorival Caymmi.
Marina, morena / Marina, você se pintou
Marina, você faça tudo / Mas faça um favor
Não pinte esse rosto que eu gosto
Que eu gosto e que é só meu…
Um das músicas mais tocadas em seu ano de lançamento, na voz de Isaurinha Garcia
Quando o carteiro chegou / E o meu nome gritou / Com uma carta na mão
Ante surpresa tão rude / Nem sei como pude / Chegar ao portão…
Sucesso na voz de Francisco Alves. Lupicínio conta que ele de fato viu uma mulher que amava nos braços de outro homem.
Você sabe o que é ter um amor, meu senhor?
Ter loucura por uma mulher
E depois encontrar esse amor, meu senhor
Nos braços de um tipo qualquer…
É uma das mais belas dentre as famosas canções praieiras de Dorival Caymmi. Foi aproveitada na peça teatral Joujoux e Balangandãs.
O mar quando quebra na praia / É bonito, é bonito.
O mar / Pescador quando sai nunca sabe se volta, nem sabe se fica…
Grande sucesso do grupo Anjos do Inferno no início dos anos 1940. Em 1944 a música integrou a trilha sonora do filme da Disney “The Three Caballeros”.
Você já foi à Bahia, nega? Não? Então vá!
Quem vai ao Bonfim, minha nega / Nunca mais quer voltar
Muita sorte teve / Muita sorte tem / Muita sorte terá…
Abaixo, destacamos as fotos de alguns dos artistas citados neste artigo.
E essa foi a nossa Seleção de Sucessos com as melhores músicas da década 1940.
Esperamos que tenha gostado!
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