Sinal Fechado – Paulinho da Viola

Sinal Fechado é uma canção singular no repertório do sambista Paulinho da Viola. Vencedora do último festival de música popular brasileira da TV Record, em 1969. Neste post vamos contar um pouco da sua história.

Sinal Fechado Paulinho da Viola

Paulinho da Viola

Paulinho da Viola sempre foi ligado ao samba tradicional e, ainda jovem, adotou a Portela como Escola do coração. Mas, ao mesmo tempo, ele viu surgir bem à sua frente o revolucionário tropicalismo, afinal de contas, morava na mesma pensão que Caetano Veloso. E por força do destino, Paulinho foi o primeiro a ouvir do cantor baiano uma composição “tropicalista”: a música “Paisagem Útil”, em 1967. Caetano conta que Paulinho, de cara, percebeu a novidade, mas nem gostou nem desgostou, e ainda não conseguia sequer classificá-la pois não ouvira nada igual antes.

Isso tudo pra dizer que essa proximidade com o pessoal da Tropicália, e suas pretensões vanguardistas, influenciaram, de uma maneira ou de outra, a composição de Sinal Fechado. Afinal de contas, essa música é diferente de tudo que Paulinho fizera até então, e mesmo que faria ao longo de sua gloriosa carreira.

A Música Brasileira em 1969

No ano de 1969, Caetano e Gil, articuladores do movimento tropicalista, estavam exilados em Londres. Chico Buarque estava na Itália e Edu Lobo, provavelmente, estava nos Estados Unidos. Só pra citar alguns dos jovens compositores mais prestigiados da época. Por sua vez, os militares estavam mais violentos e repressivos do que nunca, após o AI-5 de 1968.

Mas a vida seguia, de um jeito ou de outro, e haveria mais um festival de música popular brasileira da TV Record, o quinto desde 1965, e que seria também o último.

Os tropicalistas Gal Costa e Tom Zé arrasaram no Festival do ano anterior. Gal se firmara como musa do movimento cantando Divino Maravilhoso (Caetano e Gil) num estilo Janis Joplin. E Tom Zé conquistou o primeiro prêmio com “São Paulo meu amor”. Mas 1969 seria um ano reacionário.

Segundo o regulamento, estava proibido o uso de guitarra elétrica nas apresentações. Nitidamente, um festival antitropicalista e que privilegiava a tradição da nossa música. Ainda assim, Paulinho da Viola inscreveu Sinal Fechado, uma música que podemos chamar, até mesmo, de experimental, se não quisermos repetir o termo vanguardista. Canção que, apesar de excelente, era uma aposta alta para concorrer a um festival.

Paulinho da Viola e seu Violão

Sinal Fechado

O tema central da música já fazia um tempo que rondava a mente de Paulinho. As pessoas não podiam conversar livremente, e o compositor conta que tinha mesmo um amigo que sempre dizia que precisava conversar algo importante com ele, mas nunca chegava o dia dessa conversa. Com a Ditadura marcando pesado quem se arriscasse falar o que quisesse, o clima de medo imperava e exigia comedimento, quando não, silêncio absoluto.

E finalmente Paulinho teve um sonho em que ele estava num ônibus, e alguém entrava e queria conversar com ele, mas eles iam se comunicando apenas por sinais. Por tudo isso, a música narra o encontro de duas pessoas num sinal fechado, que conversam brevemente, através de frases curtas e superficiais. Ao mesmo tempo elas revelam um clima crescente de tensão e ansiedade, típico de quem vivia na época e desconfiava das paredes, do vento e da própria sombra. Trata-se, por fim, de um diálogo que não se realiza de fato. Afinal, o que eles querem dizer, realmente, é adiado para um encontro futuro, que nunca acontecerá, talvez. Adeus…

Paulinho com sua maestria no violão, criou uma melodia simples e repetitiva, mas que dava conta de criar uma atmosfera melancólica e angustiante.

O V Festival de Música Popular Brasileira

Foi um Festival bastante desorganizado. A TV Record já não tinha mais interesse no formato e o festival foi misturado à grade da emissora, sendo uma variante do programa “Quem tem medo da verdade?”, que tinha por objetivo criar polêmica pra dar IBOPE. Tanto que Sinal Fechado foi avaliada por um jovem como “verdadeira música de ninar defuntos”. A cantora Maysa, por sua vez, defendeu: “música e letra de uma dignidade que estava faltando nesse Festival”. Ou seja, a organização do Festival, duramente criticada então, expunha os artistas, submetendo-os a um show de calouros, praticamente.

Para o público, os favoritos eram Agnaldo Rayol com o Trio Mocotó, defendendo “Clarice” (de Eneida e João Magalhões); e Vanusa defendendo “Comunicação” (de Édson Alencar e Helio Matheus). Ainda corria por fora a música “Gostei de Ver” (Eduardo Gudin e Marco A. Silva Ramos) defendida por Márcia e os Originais do Samba; além de “Moleque”, de Gonzaguinha (que venceu como melhor letra).

Sinal Fechado só era preferida pelos especialistas. E é bastante inusitada a cena em que os jurados e demais participantes pedem silêncio à plateia, para que a música, já declarada vencedora, pudesse ser executada. Afinal de contas, ela tem mesmo um tom bastante intimista. Dessa maneira, uma inovadora canção de protesto, velada e aparentemente ingênua, vindo de alguém do samba e não de um rebento da MPB tradicional, venceria o festival da reação. O festival esvaziado. O último festival da TV Record. Adeus…

Foi Um Rio Que Passou em MInha Vida

Mas não era tão óbvio que Sinal Fechado representava tudo isso na época. Porque assim que acabou o Festival, Paulinho da Viola correu para o estúdio e gravou um compacto duplo, contendo 4 músicas, duas delas eram “Sinal Fechado” (claro) e “Foi um rio que passou em minha vida” que ele havia feito em homenagem à Portela. “Foi um rio…”, igualmente com qualidades indiscutíveis, estourou nacionalmente deixando Sinal Fechado no chinelo.

Muita gente se deixou levar pelo samba “Foi um rio que passou em minha vida”. Paulinho da Viola conheceu um sucesso até então inimaginável. No ano seguinte, em 1970, por tudo isso, Paulinho regravou “Foi um rio…” num LP homônimo.

A campeã Sinal Fechado, por sua vez, não ganhou vida numa regravação. Ficou retida no compacto de 69 e excluída do novo LP. Fato que se justifica porque ela se diferia muito do estilo do cantor. E é mesmo provável que ela se tornasse uma música pouco lembrada hoje em dia se não fosse Chico Buarque.

Sinal Fechado para Chico Buarque

Em 1974 Chico estava sofrendo muito com a censura dos militares e decidiu gravar um disco só com músicas de outros compositores (exceto Julinho de Adelaide que era um heterônimo seu). Daí sua ideia de gravar Sinal Fechado. Além disso, ele intitulou o disco com o nome da música pra servir de protesto, afinal de contas, o sinal estava fechado pra ele. Sinal Fechado, finalmente, ganharia uma sobrevida.

E eis que quando as pessoas ouviram Sinal Fechado na voz de Chico Buarque, aí sim, ficou clara e evidente a característica subversiva da letra.

Paulinho conta, inclusive que passaram a achar que a música era do Chico, e que ele se surpreendia quando cantava em algum show e as pessoas perguntavam: essa música não é do Chico Buarque?”.

Regravações Históricas

Paulinho regravaria Sinal Fechado algumas vezes, sempre com elegância e sobriedade. Chico Buarque, por sua vez, também regravou, mas numa interpretação, digamos, dramática, em dueto com Maria Bethânia (1974). Depois deles, as regravações mais significativas de Sinal Fechado foram do Grupo MPB-4 no disco oficial do Festival – que não contou com Paulinho por questões contratuais (1969); de Elis Regina (1974) e de Fagner (1976).

Em resumo, se Sinal Fechado pode ser considerada um sucesso improvável, inegavelmente é uma das músicas mais geniais da história da MPB.


Para Ouvir

Versão de Paulinho da Viola no Festival.

Versão de Paulinho da Viola, ao vivo.


Letra Sinal Fechado

Olá, como vai?
Eu vou indo e você, tudo bem?
Tudo bem eu vou indo correndo
Pegar meu lugar no futuro, e você?
Tudo bem, eu vou indo em busca
De um sono tranquilo, quem sabe
Quanto tempo? Pois é,
Quanto tempo…

Me perdoe a pressa
É a alma dos nossos negócios
Oh! Não tem de quê
Eu também só ando a cem.

Quando é que você telefona?
Precisamos nos ver por aí
Pra semana, prometo talvez nos vejamos
Quem sabe?
Quanto tempo?
Pois é, quanto tempo…

Tanta coisa que eu tinha a dizer
Mas eu sumi na poeira das ruas
Eu também tenho algo a dizer
Mas me foge a lembrança.

Por favor, telefone, eu preciso
Beber alguma coisa, rapidamente
Pra semana. O sinal
Eu procuro você
Vai abrir, vai abrir
Prometo, não esqueço
Por favor, não esqueça, não esqueça, não esqueça
Adeus.


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