Acabou Chorare – Novos Baianos

Série Melhores Discos da MPB

Acabou Chorare - Novos Baianos

Acabou Chorare é considerado por muitos especialistas como o melhor álbum da história da música popular brasileira.

Lançado em 1972 pela Som Livre, foi o segundo disco do grupo Novos Baianos, cuja formação inicial se deu em 1968/69. Fortemente influenciados pela Contracultura e pelo Tropicalismo, eles já faziam um trabalho experimental, tanto na poesia de Luiz Galvão quanto na mistura de ritmos musicais, com o rock psicodélico predominando na guitarra.

A Influência de João Gilberto

Um fato que contribuiu para transformar a sonoridade do grupo foi a presença de João Gilberto. Ele já conhecia Luiz Galvão da Bahia, e este o convidou para conhecer o trabalho da banda depois que o grupo se mudou para o Rio de Janeiro.

É importante ressaltar quem foi João Gilberto. Ele revolucionou a música popular brasileira no final dos anos 1950, através da Bossa Nova. Na ocasião, ele criou uma nova forma de fazer música, mas sem romper com tudo que veio antes dele.

E ele seguiu novamente essa receita apresentando ao grupo um repertório de música brasileira – e mais propriamente de samba – desconhecido por eles. Além disso, João assistia a ensaios, dava opiniões, sugeria mudanças.

Como os Novos Baianos eram muito abertos para assimilar estilos e absurdamente criativos, não é surpresa que chegassem a níveis incomparáveis de originalidade e perfeição.

O Disco

Pelas razões acima, Brasil Pandeiro abre o disco. Trata-se de uma canção composta por Assis Valente nos anos 1940 indicada por João Gilberto e que de alguma forma é o grupo pedindo passagem. “Brasil, esquentai vossos pandeiros e iluminai os terreiros que nós queremos sambar”. É uma necessidade urgente!

Todas as demais composições trazem a parceria de Luiz Galvão e Moraes Moreira. A divisão de funções no grupo se dava basicamente neste esquema: Moraes Moreira (voz e violão), Luiz Galvão (letras), Paulinho Boca de Cantor (voz e pandeiro), Baby Consuelo (voz e percussão), Pepeu Gomes (guitarra, craviola e violão), Jorginho Gomes (cavaquinho), Dadi Carvalho (baixo-elétrico), Bolacha (bongô).

A Vida Comunitária dos Novos Baianos
Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor, Moraes Moreira, Luiz Galvão e Baby Consuelo.

Faixa a Faixa

Depois da contagiante Brasil Pandeiro, onde essa gente bronzeada mostra seu valor anunciando querer sambar, vem a multi-ritmada Preta Pretinha, que começa tranquila com violão e voz de Moraes Moreira e depois se transforma. A letra foi inspirada em um insucesso amoroso de Galvão, cuja namorada baiana, no último momento, não quis seguir com ele para o Rio de Janeiro.

O baião dá as caras em Tinindo Trincando. Ao mesmo tempo Pepeu Gomes faz seu primeiro solo de guitarra. A faixa tem voz solo de uma versátil Baby.

“Minha carne é de carnaval, meu coração é igual”. Assim começa Swing em Campo Grande, com instrumentos de cordas em destaque e voz de Paulinho Boca de Cantor, que também assina autoria da letra. Que é de certa forma codificada, pois faz menção à perseguição que sofriam pela Ditadura. Por isso ele complementava: “eu não marco toca, eu viro toco, eu viro moita”.

Finalmente Acabou Chorare, que dá nome ao disco. A história da música Acabou Chorare é tão bonita que merece uma postagem especial. A gravação é praticamente um Moraes Moreira à la João Gilberto. Voz mansinha, violão sereno. Além disso, era Bebel Gilberto, filha de João com a também cantora Miúcha, que ainda criança, quando se machucava dizia: acabou chorare, acabou chorare.

Inspiração de Acabou Chorare
Miucha, Bebel e João. Ela seria “co-autora” de Acabou Chorare.

Lado B

Mistério do Planeta tem uma força poética única que revela as reflexões de Luiz Galvão acerca de si mesmo e suas experiências de vida. “Vou mostrando como sou / E vou sendo como posso / Jogando meu corpo no mundo / Andando por todos os cantos / E pela lei natural dos encontros / Eu deixo e recebo um tanto”. Na voz de Paulinho Boca de Cantor e instrumentos de cordas, com Pepeu Gomes se revezando no violão e na guitarra.

A Menina Dança foi composta especialmente para Baby Consuelo (que anos depois seria Baby do Brasil), tanto pra ela cantar quanto pra reconhecer a si mesma na letra. Uma música com uma batida irresistível e deliciosa de ouvir pela alegria que a cantora transmite na voz.

Na sequência Besta é Tu. Moraes Moreira revelou em entrevista: “O ‘besta é tu’ é um ritmo baiano do interior repetido à exaustão”. Pegamos emprestado do cancioneiro popular. A gente tomava LSD e desatava a tocar o ‘besta é tu’ interminavelmente”.

A música foi uma das que fizeram mais sucesso na época. Foi também uma forma que Galvão encontrou de responder aos que consideravam o grupo alienado: “Por que não viver esse mundo, se não há outro mundo? (…) E pra ter outro mundo é preci-necessário Viver!”

E finalmente Um Bilhete pra Didi. Composição instrumental formidável, que amarra toda a proposta musical do grupo com os irmãos Jorginho e Pepeu Gomes arrebentando, no cavaquinho e guitarra, respectivamente.

Faixa Extra

No disco ainda há uma repetição de Preta Pretinha na faixa final. A gravadora encurtou a música pra poder tocar nas rádios, já que a versão principal tem quase o dobro de duração.

A Força de Acabou Chorare

Para entender por que o disco Acabou Chorare é tão reverenciado basta perceber a originalidade de seus integrantes, as múltiplas vozes de Baby, Moraes e Paulinho. Revezando nos vocais e dando tons muito característicos a cada interpretação, com seus sotaques e estilos particulares.

Moraes Moreira tinha uma consciência musical absurda. Baby era uma garota cheia de vida, de energia, e com uma voz maravilhosa. Paulinho tinha uma presença muito carismática e um ritmo incrível.

Isso sem falar dos arranjos criativos e do ecletismo musical dos demais integrantes. Por exemplo os irmãos Gomes, com destaque para Pepeu, que eram de um virtuosismo impressionante.

Luiz Galvão é um poeta que traduzia o espírito do grupo, compondo letras sensíveis e ao mesmo tempo irreverentes e imprevisíveis.

Novos Baianos

Todos, individualmente, são personagens riquíssimos. E reunidos, não por acaso, formaram uma verdadeira comunidade. Os integrantes da banda e seus respectivos agregados moravam em um mesmo sítio em Jacarepaguá. Algo que talvez não tenha precedentes na história da música.

Enquanto estiveram juntos foram muito coesos. Demonstravam muito senso de coletivo. Até por isso, Luiz Galvão, que não tocava ou cantava, estava presente nas apresentações do grupo.

Acabou Chorare é de fato um dos melhores discos da música popular brasileira. Pela genialidade das letras, pela riqueza sonora das músicas, gostosas de ouvir e ao mesmo tempo dançantes. Todas cheias de ritmo e personalidade.

Enfim, da brasilidade mestiça que gostamos de ver no Canto da MPB.

Acabou Chorare - Encarte para CD
Capa de Acabou Chorare no relançamento em CD.

Ficha Técnica de Acabou Chorare

Brasil Pandeiro – Assis Valente
Preta Pretinha – Luiz Galvão / Moraes Moreira
Tinindo Trincando – Luiz Galvão / Moraes Moreira
Swing de Campo Grande – Paulinho Boca de Cantor / Luiz Galvão / Moraes Moreira
Acabou Chorare – Luiz Galvão / Moraes Moreira
Mistério do Planeta – Luiz Galvão / Moraes Moreira
A Menina Dança – Luiz Galvão / Moraes Moreira
Besta é Tu – Luiz Galvão / Pepeu Gomes / Moraes Moreira
Um Bilhete Pra Didi – Jorginho Gomes


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